segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

ABUSO DE AUTORIDADE POR POLICIAIS EM BARREIRAS

Por Paula Vielmo


Na noite de 20 de dezembro, por volta das 23:15, estava sentada com uma amiga na Praça São João Batista quando uma viatura policial veio em alta velocidade e parou bruscamente, freando como em uma perseguição perigosa. O veículo não foi corretamente estacionado e ficou no meio da rua, na diagonal, e desceram três policiais (dois homens e uma mulher).
Assustada, observei o que acontecia sem saber realmente como reagir. Inicialmente pareceu uma abordagem de “rotina” da PM, quando “reconhecem” perfis perigosos, como os jovens que estavam bebendo naquela Praça. Sim, o perfil preferido da polícia: jovens, negros e pardos, com trajes fora dos padrões e “aparência de meliantes”.
Após aquela abordagem, na qual jogavam os objetos de um dos jovens de maneira agressiva no chão, pegaram este mesmo jovem e carregaram para perto da viatura. Momento de pânico! Será que ele seria preso? Seria espancado? Seria morto? Ele foi segurado pela gola e empurrado na lateral direita do carro por um dos policias, enquanto o outro ficava próximo e a PFEM batia a porta do camburão, em explicito ato de violência psicológica. Após bater a cabeça do jovem no vidro por duas vezes, entre palavras que não pude ouvir, ele foi “liberado” com um tapa na cabeça.
Felizmente, creio que a nossa presença na Praça tenha constrangido levemente os policiais e evitado algo pior. É o que coloco como hipótese diante da assustadora violência da Polícia e a falta de pudor para fazer tais atos extremamente abusivos em pleno espaço público. Sabemos que em locais desertos e nas cadeias acontecem situações que nem imaginamos, conforme constantes denúncias e relatos. Esse é o perfil da Polícia, desse Aparelho de Repressão do Estado.
Em sua clássica obra “Ideologia e Aparelhos Ideológicos do Estado”, o francês Louis Althusser nos ensina que o Aparelho de repressão do Estado utiliza da violência (física ou não) e não da ideologia para conseguir o que deseja, apesar de que a violência é uma maneira de manter a ideologia dominante. Assim, percebemos que a violência policial é uma ação estatal, ou seja, uma violência institucional, presente cotidianamente.
Tal atitude dos PMs desmoraliza cada dia mais a polícia, que para as pessoas de senso comum, deveria “proteger a população. Ora, o papel da polícia é esse: garantir a reprodução e manutenção do status quo, incluindo o extermínio de uma parcela da população enquadrada como perigosa a partir de valores burgueses ou da ideologia dominante, como preferir.
Lamentar tal fato diante da consciência de que ele faz parte dessa estrutura de poder estabelecida não adianta. E isso me leva a reforçar de que é preciso radicalizar na tomada de poder pelo povo para acabar com tais situações de violência, para transformar o Estado em aliado da população, modificando totalmente sua infraestrutura, até o seu fim. Nada mais atual do que o comunismo diante de tal fato.


segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Mandela e Fidel, relação especial

Por Cauê Seignermatin Ameni
 
 
Mitos do século XX, governantes da África do Sul e Cuba inspiraram-se mutuamente.
Para Mandela, presença cubana na África foi vital contra apartheid


Um Nelson Mandela adocicado, quase insosso, emergiu dos noticiários horas depois de morrer. Especialmente no Brasil, aponta-se o líder sul-africano como uma espécie de unanimidade, alguém que dirigiu o desmonte do apartheid quase sem enfrentar oposição. Neste sentido, ele seria o antípoda de gente como… Fidel Castro — este, rancoroso, ranzinza e ressentido. Publicado hoje, um texto de Hirania Luzardo, editora senior do Huffington Post, mostra que tal visão é absolutamente fictícia. Além de manterem longa amizade pessoal, Mandela e Castro inspiraram-se mutuamente e cooperaram de forma intensa.
 
O triunfo da Revolução Cubana, de 1959, inspirou o jovem Mandela a articular o braço militar do Congresso Nacional Africano (ANC/CNA). Denominada Lança da Nação (Umkhonto we Sizwe, na língua zulu), foi fundada 16 de dezembro, junto ao Partido Comunista da África do Sul, como resposta à sistemática opressão política, social e econômica movida contra a população negra, mestiça e indiana da África do Sul pelo regime político do Apartheid. Ou seja: Mandela compreendeu que a conquista de igualdade racial exigiria ruptura radical com o status quo. 

Além disso, a presença militar cubana no sul da África contribuiu com a queda do regime de apartheid. Entre 1974 e 1980, logo após a independência de Angola, cerca de 300 mil soldados cubanos foram enviados à região, em apoio ao governo recém-formado em Luanda — que sofria ameaça de tropas ligadas à vizinha África do Sul e EUA. Esta presença debilitou militarmente o exército racista sul-africano. Em paralelo, Cuba participou com brigadas militares e médicas em diversos países africanos. De tal sorte que, a primeira campanha de vacinação contra a poliomielite realizada no Congo, foi organizada por médicos cubanos – décadas antes do Brasil fazê-lo.
 
Após sair da prisão (em 1990), a primeira ação de Nelson Mandela foi visitar Cuba, no ano seguinte, para expressar sua admiração e respeito pelo regime do país. ”Quem treinou o nosso povo, quem nos forneceu recursos, que ajudaram tanto nossos soldados, nossos doutores?” perguntou Nelson Mandela a Fidel Castro durante sua visita a Havana. “Quando você vem nos visitar?”.
 
Isso ocorreria em 1994. Nelson Mandela elegeu-se presidente na primeira eleição democrática após o desmantelamento das leis discriminatórias. Fidel foi convidado de honra à cerimônia de posse. E ouviu um elogio sentido: “O que Fidel tem feito por nós é difícil descrever com palavras. Primeiro, na luta contra o apartheid, ele não hesitou em nos dar todo tipo de ajuda. E agora que somos livres, temos muitos médicos cubanos trabalhando aqui”.
 
A relação diplomática formal entre Cuiba e África do Sul foram estabelecidas em 11 de maio. Em toda África, há cerca de 4 mil médicos cubanos. Para o aniversário de 90 anos de Mandela, Fidel enviou uma mensagem parabenizando-o:
 
“Glória á ti, Nelson, que passou 25 anos na prisão defendeu a dignidade humana! Calúnia e ódio não puderam fazer nada contra a sua resistência de aço. Você foi capaz de resistir e sem saber, ou almejando ser, você se tornou um símbolo do que há de mais nobre na humanidade. Você vai viver na memória das futuras gerações, e na memória dos cubanos que morreram defendendo a liberdade de seus irmãos em outras terras do mundo “.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

JULGAR, CONDENAR E FORMAR OPINIÃO: A MÍDIA E A CRECHE PRIMEIROS PASSOS

Por Shirley Pimentel de Souza



Na terça-feira dia 19/11 quando fui buscar meu filho na Creche Escola Primeiros Passos, em Barreiras/BA, fui surpreendida com a notícia de que a Creche havia sido denunciada por maus tratos a uma criança. Minha surpresa se deu principalmente pelo fato de minha análise enquanto pedagoga e principalmente enquanto mãe, ser muito positiva acerca do trabalho desenvolvido por aquela instituição. Assim, não dei tanta importância ao fato no primeiro momento. No dia seguinte ao ouvir os relatos das pessoas sobre a reportagem comecei a ficar apavorada e resolvi assistir ao vídeo. De fato não era a atitude mais adequada pedagogicamente para educar uma criança que cometeu alguma indisciplina, mas estava longe de ser a cena descrita no texto da reportagem que enfatizava que a criança havia sido “amarrada e deixada sozinha em um quarto escuro” ou título da reportagem em alguns blogs que dizia “crianças são privadas de alimentação e amarradas em creche”. As pessoas que me abordaram para falar do assunto já vinham com uma posição de condenação da creche sem sequer ter ouvido outras versões da história. Como estava achando tudo aquilo muito estranho a única coisa que eu respondia era “gente, meu filho adora a creche. Vamos analisar com calma pra não fazer julgamento errado”.


No dia 21/11 foi feita uma reunião com as famílias dos estudantes para esclarecer os fatos e, na minha avaliação, ficou bastante evidente a armação que foi feita para criar o “show midiático” que se tornou o caso. Não quero aqui fazer uma defesa da Creche em questão, visto que a polícia, que é o órgão oficial que tem autoridade no assunto, ainda está investigando o caso. Porém, alguns elementos me chamaram a atenção e quero destacar aqui dois deles: O primeiro elemento que me deixou intrigada e que me motivou a escrever este texto foi a forma como os jornais virtuais e blogs da região trataram o tema, no geral apenas reproduzindo a notícia apresentada pela Rede Globo. Destaco este ponto, visto que uma das características destes meios de comunicação alternativos é justamente a de mostrar pontos de vista negados pelos meios de comunicação de massa, em especial a televisão, que historicamente tem posturas unilaterais e com interesse na notícia mais vendável e não necessariamente na realidade dos fatos. Deste modo, é importante refletir sobre a confiabilidade na informação que nos é passada pelos diversos meios de comunicação, visto que, como neste caso, mais de vinte blogs copiaram os textos uns dos outros, fazendo pequenas modificações de palavras e simplesmente reproduzindo uma versão da notícia, alguns exagerando nos elementos apresentados e outros fazendo juízo de valor. Assim, o fato que inicialmente ocorria com uma criança específica foi generalizado e colocado no plural (crianças). No decorrer da reprodução da notícia, além de amarradas em quartos escuros as crianças também eram privadas de água e alimentação. E tudo isto ocorria regularmente e até então nenhum pai ou mãe havia percebido nada de anormal com seus filhos. Isto no mínimo é uma situação muito estranha de se conceber.

O segundo elemento que me chamou a atenção se refere à polêmica que se levantou acerca da indisciplina quando a creche evidenciou que, ao cometer alguma indisciplina, a criança “perde o direito” e é colocada no “cantinho do pensamento”. Tanto na reunião com as famílias, quanto nas conversas com outras pessoas sobre o assunto, as opiniões não são as mesmas sobre as formas de disciplinar as crianças e no geral os discursos são carregados de senso comum e também de preconceitos sobre a temática. Ouvi comentários que vão desde “isto é falta de surra” até “criança nesta idade não tem noção do que faz”. No geral os comentários demonstravam estilos educativos ou muito autoritários ou muito permissivos, sendo ambos bastante problemáticos, visto que não dão oportunidade para que a criança crie autonomia nem compreensão das regras sociais necessárias à convivência em sociedade. A temática da (in)disciplina é muito ampla e complexa e envolve estudos na área da psicologia, da pedagogia e ainda outras como a sociologia e a história. Assim, gostaria apenas de chamar a atenção para a necessidade da parceria entre família e escola, pois mesmo cada uma destas instituições tendo papeis bastante específicos no processo de formação da criança, existem intercessões nestes papeis que precisam ser compartilhadas, debatidas e definidas com clareza, visto que trata-se da atuação das principais instituições educativas da criança (família e escola). Então cair no discurso de culpar uma ou outra não resolverá o problema.
Para finalizar gostaria de destacar o quanto é preocupante o fato de nos informarmos e formamos opiniões a partir de visões unilaterais apresentadas pela mídia e em especial a mídia televisiva. Assim, seria importante que praticássemos mais frequentemente a nossa capacidade filosófica de questionar frente às informações midiáticas: a quem interessa esta notícia, neste formato que está sendo posto? Qual o contexto social, cultura, político, econômico e espacial que o fato aconteceu? O que está sendo apresentado condiz com a verdade? A verdade tem apenas uma face ou várias? Posso julgar e condenar a partir apenas do que me foi apresentado por esta mídia? Creio que estes são apenas alguns dos questionamentos que precisamos fazer antes formar opinião sobre qualquer fato apresentado pela mídia, seja ela qual for, inclusive esta que você esta utilizando agora para ler este texto. Não existem verdades absolutas e sim perspectivas da realidade.