Por Paula Vielmo
Texto preparado para a fala na mesa redonda na Tarde da Democracia, promovida pela Pastoral da Juventude no dia 22 de abril de 2017, em Barreiras/Bahia.
Boa tarde a todas e todos. Quero agradecer a
confiança do convite, feito pela PJ por Alana Bagano. A parceria com a PJ é
antiga, dos tempos em que eu era jovem e espero contribuir com as reflexões
sobre o tema que me foi proposto. Aliás, gostaria de refazer o tema para o
plural: Mulheres na democracia. O
plural é muito importante porque significa compreender que não existe uma
mulher universal, única, mas uma diversidade, portanto, mulheres.
Para o dicionário Aurélio, democracia é o “governo em que o povo exerce a soberania,
direta ou indiretamente”. Para o Dicionário Houaiss é “sistema comprometido com a igualdade ou a distribuição igualitária de
poder”. Como as mulheres são parte do povo e estão excluídas do processo
democrático, logo, não temos uma democracia plena, mas em processo de
construção.
O parágrafo único do Art. 1º da Constituição
Cidadã de 1988 diz que: “Todo poder emana
do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição”. A democracia brasileira não é direta, mas
representativa, exercida através da eleição de representantes. Por isso,
focarei na participação das mulheres neste modelo de democracia, mas defendo
que avancemos para uma democracia participativa, direta, onde cada pessoa tenha
consciência e que coletivamente, possamos fazer as transformações desejadas.
Durante metade do século XIX e início do
século XX, as mulheres em todo o mundo lutaram pelo direito ao voto, conhecido
como movimento sufragista. No Brasil, apenas em 1932 (portanto, uma senhora de
85 anos) as mulheres conquistam o direito ao voto. Todavia, votar não
significou mais mulheres nos espaços de poder eletivos.
O processo de redemocratização do país
coincide com a adesão do movimento feminista pela luta no terreno institucional
a partir de 1970. A luta de muitas mulheres e da bancada feminina da Câmara
garantiu que inúmeros direitos para as mulheres fossem incluídos na
Constituição Federal de 1988. No
entanto, o cenário ainda hoje no Brasil não é democrático para as mulheres.
Segundo dados do IBGE (2014), nós, mulheres,
somos 51,6% da população brasileira; Segundo o Tribunal Superior Eleitoral
fomos 53% do eleitorado nas eleições de 2016. Ou seja, somos maioria! No entanto, nós mulheres, somos sub-representadas,
ou seja, há bem poucas mulheres na democracia representativa brasileira. Poucas
são as mulheres eleitas para atuar nos Poderes Legislativo ou Executivo e
poucas estão no Judiciário.
Mas por que
temos tão poucas mulheres nos espaços de poder? Para compreender
essa questão, é preciso compreender a estrutura
social. Assim, temos um sistema sustentado na exploração dos mais pobres e
do meio ambiente pelos mais ricos (capitalismo), a sobreposição de uma raça
(branca), um padrão de sexualidade (heterossexual) e de dominação masculina (patriarcado).
É preciso reconhecer que, historicamente, aos
homens foram dedicados os espaços públicos, portanto, da política, e às
mulheres os espaços privados (lar). Assim, os homens são responsáveis
socialmente pelo trabalho produtivo e as mulheres pelo trabalho reprodutivo. A
partir dessa divisão, logo entende-se que a política, como espaço público, é
considerado inadequado para as mulheres. Por isso, é compreensível que as
mulheres sejam mais tímidas, tenham medo de falar em público, de falar no
microfone, porque são espaços e instrumentos que representam o público. Também,
por ser um espaço masculino, não estimula a participação das mulheres. Além
disso, o acumulo das jornadas de trabalho dificultam a participação das
mulheres, que estão cuidando da casa e dos/as filhos/as quando não estão em
horário de trabalho remunerado.
Cientes disso, podemos ir rompendo com essa
lógica, mas ela ainda é bastante presente na sociedade brasileira, tanto que
foi preciso ter uma lei para que as mulheres pudessem ocupar os espaços
políticos. Em 1997 foi inserido na lei eleitoral a cota de gênero de 30%. No
entanto, apenas em 2009 alcançou caráter obrigatório,
tendo em vista que os Partidos Políticos continuavam sem estimular a
participação das mulheres como candidatas.
No legislativo brasileiro as mulheres ocupam
apenas 45 das 513 vagas de Deputadas Federais, são 11 mulheres dentre as 81
vagas no Senado, são 07 Deputadas Estaduais dentre 63 na Assembleia Legislativa
da Bahia e 5 vereadoras em Barreiras dentre 19. Os dados mostram que estamos
distante da democracia, pois apesar de sermos maioria da população e do
eleitorado, somos minoria representativa, o que implica em uma sub-representação.
No Poder Executivo, a situação piora: em 2016
foram eleitas menos mulheres prefeitas do que em 2012, sendo hoje apenas 641
mulheres (11,57%) prefeitas e
4.898 prefeitos (88,43%); Nas eleições de 2014, apenas Roraima elegeu uma governadora. Até
hoje apenas 01 mulher chegou ao posto máximo do país (presidência) e 01 foi
eleita prefeita de Barreiras.
No entanto, é preciso prestar muita atenção a
duas questões:
1)Não basta ser mulher, é preciso ter compromisso com a causa das
mulheres ampliação de direitos sociais;
2) Quem são as mulheres que são eleitas? São mulheres negras? São
mulheres indígenas? São mulheres trabalhadoras? São camponesas? São mulheres
progressistas?
Porém,
a democracia não está restrita aos espaços de poder instituídos. Democracia
para as mulheres perpassa por oportunidades de acesso e desenvolvimento na
educação e na cultura, oportunidades de acesso à trabalho e mesmos salários, possibilidades
de atuação nos partidos políticos e nos governos, divisão do trabalho doméstico
e autonomia sobre o próprio corpo, portanto, muito caminho a percorrer.
A Agenda 2030 da ONU, estabelece 17 Objetivos
de Desenvolvimento Sustentável e 169 metas. O objetivo 5 busca “alcançar a igualdade de gênero e empoderar
todas as mulheres e meninas” e a meta 5.5. almeja “garantir a participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de
oportunidades para a liderança em todos os níveis de tomada de decisão na vida
política, econômica e pública”.
Focando no objetivo desta Semana da Cidadania
que é “fazer com que a juventude reflita
mais profundamente, em grupo, algumas ações presentes em seu cotidiano,
convidando-a a se organizar em torno de projetos práticos, com reflexos na
sociedade, visando a transformação social, em comunhão com a Igreja e outros
organismos da sociedade civil”, sugiro como ações:
1) Que a PJ estimule o debate sobre a participação das mulheres,
promovendo reflexões e mudança de visão de mundo;
2) Que a PJ avalie internamente a participação das mulheres nas
coordenações, verificando se os cargos ocupados estão majoritariamente
restritos à secretariado, tesouraria e organização de eventos, reforçando os
papeis tradicionais das mulheres de organização e cuidado;
3)Que a PJ estimule as jovens mulheres a se expressarem e ocuparem
os espaços de fala nas atividades.
Por fim, na próxima sexta-feira, 28 de abril,
teremos a GREVE GERAL, contra a Reforma da Previdência, a Reforma Trabalhista e
a Terceirização, que retira direitos sociais conquistados historicamente, e
prejudica de maneira especial as mulheres, pois busca igualar o tempo de
aposentadoria, desconsiderando as várias jornadas de trabalho e precariza o
trabalho feminino, pois as mulheres já recebem salários em média 30% a menos do
que os homens e são maioria no trabalho informal, principalmente as mulheres
negras.
Para concluir, agradeço o espaço, com a
expectativa de ter contribuído e alcançado o tema que me foi proposto, bem como
almejo que encarem o desafio de ampliação da participação das mulheres como uma
causa não das mulheres, mas de cada pessoa que acredita que a democracia como
soberania popular perpassa pela incorporação das minorias sociais como
participantes ativos, dentre os quais temos as mulheres em sua complexidade e
diversidade, como maioria do povo que merece e precisa participar e ter direito
a isso, para que de fato aconteça a democracia. Obrigada!