Na semana que passou, segunda do ano letivo que começou, realizei com as turmas que trabalho (da Educação Infantil à 4ª série) os combinados de "o que pode" e "o que não pode" fazer na recreação. Essa é uma prática que adotei desde 2010, por entender que construindo junto, o acompanhamento é conjunto e mais do que isso inibe comportamentos indesejáveis, principalmente de agressão ao outro.
Pois bem, escrevi algumas ideias, baseando-me nos dois anos anteriores e conversei com cada turma, instigando as crianças para sugerirem o que poderiam ou não fazer. A maioria do que sugeriam já constava na minha proposta, o que me animou, pois estamos em harmonia de práticas, sem imposição.
Enquanto educadora que acredita, assim como Paulo Freire, que "o ato de educar é um ato político", que exige clareza ideológica e de concepções para nortear o trabalho, e consciente que a minha ação educativa é intencional e deve ser politizadora, ínclui dentre o que pode "reivindicar".
Já é uma prática o diálogo e a liberdade para que as crianças reclarem do que não gostam, bem como de sugerir o que gostariam de fazer nas aulas (na medida do possível, eu sempre encaixo as sugestões) e avaliar em rodas de conversa as nossas práticas.
No entanto, fui surpreendida com o fato de que nenhuma turma sabia o que era reivindicar e os comportamentos me deixaram muito preocupada:
- Da Educação Infantil (Pré II) ao 2º ano as crianças, ao meu questionamento "pode ou não pode reivindicar", mesmo não sabendo o que era respondiam uníssonamente "nãoooo". Após a minha explicação, paravam e respondiam divididos "não" e "sim". Fui simplista com os/as pequenos/as e defini como "reclamar de algo que não acha bom e quer melhorar". A conclusão era de que eles podiam e deviam fazer isso;
- Do 3º ano à 4ª série, as crianças respondiam "não" e algumas poucas perguntavam "o que é isso?". Após colocá-las em desequilibrio cognitivo: "pode ou não pode? Tem certeza que pode? Tem certeza que não pode?", explicava e chegavam a conclusão, na maioria, que poderia sim!
De todas as mais de 400 crianças, apenas Daniel respondeu prontamente que sim, definindo reivindicar como "lutar pelos direitos", e uma turma de 4ª série foi procurar no dicionário o conceito.
De tudo isso, concluí que nossa educação escolar realmente não forma para a participação e a cidadania propalada não dá direito, mas apenas deveres. Não emancipa, mas adestra. Não politiza, mas esvazia e amedronta.
Que crianças pequenas, de 4 ou 6 anos não saibam o que a palavra significa eu entendo, mas que os de 8 ou 10 anos não saibam, é inadmissível, ainda mais quando se realiza diversas paralisações que possuem uma pauta de reivindicação. Será que as crianças não são sequer informadas sobre os motivos das paralisações docentes? Elas não são instigadas a participar desde cedo, pois o autoritarismo e a relação de poder entre professor/ e aluno/a ainda é muito forte, bem como do adulto sobre a criança.
É preciso educar politicamente desde cedo as nossas crianças. Por isso, quando o MST promove a Jornada dos Sem Terrinha, se trata de colocar as crianças no espaço e prática de luta desde a infância, e só educando na luta e para a luta desde pequenos que poderemos formar, realmente, sujeitos politicos-sociais combativos.
domingo, 20 de fevereiro de 2011
Crianças e reivindicar: o que é isso?
Por Paula Vielmo¹
¹ Pedagoga e recreadora municipal
"Sou uma combatente provisória de uma causa quase eterna do ser humano. Acredito ter como bandeira, se não um sonho perfeito, a melhor utopia possível"
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Li uma frase de Paulo Freire:"Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes
ResponderExcluirbrincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda." (Paulo Freire)
Parabéns Paula, é desde cedo que se forma uma cidadão. Reivindicar é antes de mais nada, ser! É isso aí.
Concordo plenamente Paula Vielmo, se desde pequeno que nossas crianças/estudaates são educadas (os) para serem machos e as mulher (mulherzinhas)- o que nós dois repudiamos veementemente- , é também desde a mais tenra idade que se aprende a reivindicar e a ser cidadãos sujeitos ativos, participativos, reflexivos e transformadores da sociedade. Adorei o texo!!!Parabéns!
ResponderExcluir