sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Retrocesso na Câmara Municipal de Barreiras: o que esperar a partir de 2017?

Por Paula Vielmo


Distante de termos qualquer mudança política em relação aos 19 vereadores eleitos para o mandato 2017-2020, considero que tivemos  um retrocesso na composição da Câmara Municipal de Barreiras, cujo perfil a partir dos eleitos ficou ainda mais conservadora, tendo em vista a reeleição de 9 vereadores, dentro os quais alguns de posturas reacionárias ao extremo, como Gilson Rodrigues (DEM), o retorno de vereadores que já tiveram mandatos e não fizeram nada de significativo (Irmã Silma, Sobrinho, Cézar da Vila) e outros sem muito potencial para empreender mudanças significativas, tendo em vista a forma de fazer política. Em resumo, nada de novo!

Para piorar a já baixa quantidade de mulheres na política representativa, houve redução na presença de mulheres na Câmara de 5 para 3 vereadoras, sendo que nenhuma das eleitas tem práticas nem propostas voltadas para as mulheres ou à igualdade de gênero. Se o mandato de Karlúcia Macêdo (PMDB) como vereadora foi de destaque nos últimos anos, a partir da campanha como vice-prefeita, ela assume uma posição secundária, ficando praticamente invisível.

É comum após as eleições iniciarem debates e acordos sobre a presidência da Câmara Municipal. Em Barreiras não foi diferente e logo após a eleição, inúmeros eleitos já anunciavam a pretensão de assumir tal posto, tais como João Felipe (PTB), Gilson Rodrigues (DEM), Marcos Reis (PTN).

Infelizmente, é comum também nesta velha política no qual estamos inseridas/os, que a autonomia do poder legislativo seja colocada em xeque diante de uma maioria de vereadores/as sob a sigla do prefeito eleito. Em Barreiras também não foi diferente.

Dos 19 vereadores/as eleitos/as, segundo pesquisa no site do TSE, 11 estão sob a coligação/base de Zito Barbosa (DEM), a saber: Irmã Silma e Eurico Queiroz (PRB), Otoniel (PDT), Dra. Graça e João Felipe (PTB), Eugênio (PMDB), Dr. José Barbosa (PSC), Almery e Gilson Rodrigues (DEM), Carlos Costa (PHS) e Cézar da Vila (PT do B) e 08 foram eleitos como base da "oposição", por estarem na Coligação de Antônio Henrique (PP), a saber: BI e Carlão (PP), Vivi Barbosa (PC do B), Sobrinho (PPL), Beza (PSL), Professor Hipólito (PTC), 

Nesse jogo, em que o povo não é nada além do legitimador, o que não falta é gente desorientada e achando que "política é isso". Não! Isso é a velha política. A política como bem comum não se submete a desejos e mandos dos chefões de plantão, isso é da alçada da velha política, o que os ditos novos e antigos vereadores sabem muito bem fazer. 

No dia 28/12 uma notícia surpreendeu: "Gilson Rodrigues deve ser o novo presidente da Câmara de Barreiras". E no dia seguinte (29) "Zito reúne vereadores; Gilson já tem 16 votos", com direito a "selfie" sem qualquer pudor de intromissão de um Poder (Executivo) sobre o outro (Legislativo). Não bastasse, para posar de transparente, fazendo uso sofista das palavras, o vereador João Felipe (PTB) postou em sua página pessoal do facebook o acordo que decidiu pela chapa para a mesa diretora da Câmara e Gilson Rodrigues, do mesmo Partido de Zito, como presidente.

Esse fato nos faz refletir principalmente sobre duas questões:

1) A função de fiscalização do Poder Legislativo estará muito comprometida, com uma Câmara submissa e dependente do Prefeito (Executivo). Ao contrário do que possam argumentar, não se trata de "governabilidade", mas de submissão. Tanta, ao ponto de que um candidato eleito na base do candidato e atual prefeito não reeleito, Antonio Henrique, foi ameaçado, pelo Presidente Estadual do seu Partido, de perder o mandato, caso se negasse a "apoiar e votar no candidato que for indicado pelo prefeito eleito para a presidência da Câmara do Município".

2) Teremos na presidência da Câmara um vereador reeleito, sem nenhum trabalho relevante à comunidade e que ganhou projeção após divulgação de informações falsas envolvendo o debate de gênero uando da construção e tramitação do PME, o Plano Municipal de Educação (ainda não aprovado). Este mesmo vereador tem posições públicas que afrontam diretamente os Direitos Humanos, sobretudo das mulheres e pessoas LGBT. De fato, o conceito de gênero não é de amplo conhecimento e compreensão da sociedade, mas trata-se, resumidamente, das construções sociais dos papéis masculinos e femininos em sociedade (veja também texto que escrevi na época AQUI).

Esse cenário aponta que, sem dúvidas, teremos uma situação pior em Barreiras do que a maioria da população – enganada - decidiu nas urnas. Nesse contexto, destaca-se o jovem João Felipe, atual presidente do PTB, o 6º mais votado nas eleições de 2016, cuja trajetória inclui a militância estudantil secundarista, tendo ocupado o cargo de coordenador de Politicas para a Juventude na gestão da ex-prefeita Jusmari Oliveira, presidente da União da Juventude Socialista (UJS) em Barreiras, assessor parlamentar da ex-deputada estadual Kelly Magalhães e enquanto filiado do PC do B, por indicação da ex-deputada, ocupou o cargo de Coordenador Regional do Sine-BA,  na Secretaria Estadual do Trabalho, Emprego e Renda, tendo mudado de sigla partidária (veja nota do PC do B sobre o fato), filiando-se ao Partido Trabalhista Brasileiro e de imediato assumido a presidência do mesmo. Necessário registrar a severa mudança ideológica (de um Partido considerado de “Esquerda” para um Partido considerado de “Direita”) para atender o objetivo de ser eleito, projeto alcançado com sucesso.

Esse jovem, que impressiona muita gente merece atenção em relação às suas velhas atitudes, ao discurso sedutor e ao caminho que trilha lado a lado com velhos políticos profissionais. Ele, que foi discriminado pela vereadora Núbia em determinada ocasião em virtude de sua orientação sexual agora se alia com aqueles que oprimem a sexualidade que foge da norma. Obviamente não se legisla com a sexualidade, mas é óbvio também que o que somos enquanto seres nos constituí como sujeitos políticos e influencia em nossas escolhas. Em tempos de ataques aos Direitos Humanos, toda atenção é preciosa e deve ser precisa.

João Felipe afirmou que a chapa para a Mesa Diretora da Câmara e o possível presidente Gilson não influenciarão no seu trabalho na Câmara e na defesa das minorias sociais. Essa afirmação demostra desconhecimento dos procedimentos e quem sabe, alguma inocência acerca do legislativo. Há quem creia nisso. 

De nossa parte, a convicção de que não teremos oposição ao prefeito, mas menos ainda fiscalização por parte da Câmara Municipal e deveremos intensificar tais ações do lado de fora. 2017 espera de nós muita luta, nada mais!



domingo, 4 de dezembro de 2016

Ato contra a PEC 55 e confronto com a PM em Brasília: o relato de quem estava lá

Por Paula Vielmo

No dia 29 de novembro, milhares de pessoas, vindas de todos os cantos do país estiveram em Brasília para o ato intitulado #OcupaBrasília, afim de manifestar-se contra a aprovação pelo senado da Proposta de Emenda a Constituição 55 (PEC 55). Eu estive presente, na caravana do SINASEFE-IFBA, juntamente com mais 40 pessoas (professores, técnicos/as e estudantes).

A nossa viagem foi longa. Saímos de Salvador na segunda (28) por volta de 10h da manhã e chegamos em Brasília quase 13h do dia seguinte. Muita gente! Diversidade de cores, idades, vestimenta, agrupamentos políticos. Uma programação também diversificada de acordo com o segmento: nós da Educação Pública tivemos uma aula sobre auditória da dívida e PEC 55 com Maria Lúcia Fattorelli, em frente ao MEC. Em seguida, às 16h começou a concentração no Museu Nacional e a partir das 17h marchamos em direção ao Congresso Nacional. 

Eu já havia participado de um ato em Brasília, que marchou até o MEC, mas nunca antes até o Congresso. Estava bastante empolgada e animada, afinal estava rodeada de milhares de pessoas (dizem entre 30 e 50 mil), gritos de ordem criativos, blocos por agrupamento (sindicatos, organizações estudantis, centrais sindicais), cartazes diferentes de tudo o que eu já havia visto, performances na rua, música, batucada, luta e alegria. 

Foto: jornalistas livres
Chamou minha atenção que as pessoas mais jovens usavam bastante o corpo para se manifestar: muitas frases de "Fora Temer" escritas pelos corpos, adesivos de protestos cobrindo os seios nus, trans, gays afeminados, embaralho do padrão visual de gênero. Tudo lindo! 

A marcha transcorria pacificamente até a chegada no Senado. Não demorou mais do meia hora pelas minhas contas e já estávamos correndo das bombas de gás lacrimogênio e de pimenta que tomaram conta do espaço.

Houve confronto de alguns poucos manifestantes com a PM, que de maneira absurdamente desproporcional jogou spray de pimenta no rosto de uma jovem que se manifestava no espelho d´ água do Congresso. Ninguém me contou, eu vi!

Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
Eu estava com o meu colega de campus do IFBA, Fábio Bordignon e na correria nos perdemos. Por alguns instantes eu só corri, até encontrar outra colega do IFBA e logo em seguida mais duas colegas e um estudante. O estudante, dizendo-se experiente em confrontos com a Polícia, foi o nosso guia. Não seguimos com a multidão, mas por fora dela.

Foto: Agência Brasil
Estava aflita. No caminho muitas pessoas (sobretudo mulheres), desmaiadas, sendo carregadas, vítimas da truculência da PM. Olhei para o alto e vi as bombas descendo. Estrondo no solo, barulho horrível, pavoroso. Correria. Mulheres, idosas, jovens, algumas crianças.

O carro de som pedia que a polícia parasse e pedia que quem tivesse leite de magnésia prestasse socorro aos demais. Haviam pontos de pessoas da área da saúde auxiliando. Eu, lá aflita. A sensação de impotência é sempre indescritível. A garganta começou a fechar e os olhos a arder. A camiseta serviria como recurso para proteger um pouco e dar condições para respirar.

Milhares de pessoas correndo. Olhei para o alto para procurar o som e vi alguns helicópteros sobrevoando. Eles jogavam bombas de gás lacrimogênio e pimenta do alto. Estava insuportável e a quantidade de pessoas passando mal aumentava.

Estávamos caminhando devagar quando três policiais se aproximaram e nos mandaram subir. Obedecemos. Atravessamos a rua de algum dos Ministérios. Outro grupo de policiais se aproximava, não sei quantos precisamente. Um deles gritou "desce porra". Havia uma escadinha estreita e foi por ela que nós e muitas outras pessoas desceram. Eu estava perdida. A sorte foi a colega que sabia o caminho e segurando na minha mãe disse para seguirmos.

Chegamos até o Museu Nacional. Precisávamos achar o restante da nossa caravana. O carro de som anunciava para nos reorganizarmos para retomar o ato. Eu queria ir. Fui. Estava impossível permanecer...a Polícia avançava e com ela a violência e as bombas de gás lacrimogênio. Não dava pra respirar. Fomos até a rodoviária em busca de nosso ônibus. Muitas pessoas correndo e a polícia avançando. Ficava cada vez pior para respirar por causa do gás. Os olhos ardiam e já não conseguiam ficar abertos sem lacrimejar.

Foto de autoria desconhecida, tirada de dentro do senado.
Encontramos um grupo de estudantes da nossa caravana. Uma tomada possibilitou ligar o celular que havia descarregado e ligar para alguém e saber onde estava o nosso ônibus. Todo mundo estava bem. Fomos embora, retornando para as nossas casas.


Desde a terça-feira que não paro de pensar no acontecido. A violência da polícia, a desproporcionalidade do ato, o enfrentamento, o nosso despreparo para o conflito apenas com nossas faixas, cartazes e gritos de ordem. As pessoas passando mal. 

Nunca estive em um campo de guerra, mas me senti em um naquele 29 de novembro.

Enquanto éramos agredidos, os senadores votavam a proposta que vai ferrar o povo brasileiro por 20 anos! Demorei para escrever porque não conseguia expressar o que aconteceu lá. Ainda não digeri. Não aceito a ideia de naturalizar o que aconteceu. Nenhuma delas. A luta continua!



1. Não tenho nenhuma foto de minha autoria porque o celular descarregou
2. Fotos disponíveis no site do SINASEFE: Clique AQUI
3. Vídeo do Mídia Ninja: Clique AQUI
4. Nenhuma foto ou vídeo é como vivenciar.