sábado, 13 de fevereiro de 2016

Flores e Pedagogia Feminista em prática

Por Paula Vielmo
Pedagoga Feminista


Pedagogia Feminista: O conjunto de princípios e praticas que objetivam conscientizar indivíduos, tanto homens quanto mulheres, da ordem patriarcal vigente em nossa sociedade, dando-lhes instrumentos para superá-la e, assim, atuarem de modo que construam a equidade entre os sexos. (Cecilia Sardenberg )



Sem sombra de dúvidas fevereiro iniciou com uma grande surpresa profissional para mim, quando repentinamente recebi no dia 01, de uma estudante do curso de Enfermagem do IFBA três belas flores. Quando eu trabalhava como recreadora no município, era comum receber bilhetes e desenhos das crianças e até um ou outro presente, mas de adultos isso é bem mais raro e para mim, foi inédito. No entanto, apesar das flores terem me comovido, foi a motivação que me causou profunda reflexão e que gostaria de compartilhar com vocês, o que chamei comigo mesma de uma Pedagogia Feminista em prática.

Bem, uma semana atrás, havia conversada com a referida estudante, que procurou espontaneamente orientação pedagógica em virtude de dificuldades que estava sentindo no curso, sobretudo no que diz respeito à apresentação de seminários, ou seja, expressar-se em público. O curso Técnico em Enfermagem é um curso feminino e mais de 90% das turmas é composta por mulheres. Somado a isso, lembremos que na divisão sexual do trabalho, as profissões ligadas ao cuidar, como a enfermagem, são as profissões consideradas femininas, portanto, justifica-se a presença maciça de mulheres. Por fim, lembremos um fato importante: as mulheres geralmente têm mais dificuldade de se expressar publicamente em virtude da educação voltada para os espaços privados (lar), devendo manter-se calada, quieta, tímida. Tais características são consideradas virtudes femininas.

Dito isso, quando recebi as flores, fiquei sem entender o motivo. Foi então que veio a surpresa quando ela relatou que estava passando por problemas em casa e eu havia ajudado. Como assim, pensei eu? Não havia percebido nada de diferente em nossa conversa. Em seguida ela disse que o marido estava cobrando casa limpa e organizada, o que gerava pressão e desgaste em casa e ela estava abalada com isso. Eis que de repente, eu percebi o que havia acontecido e entendi o motivo das flores! 

Em nossa conversa, orientei sobre a rotina de estudos, local, organização do tempo. A estudante estava dormindo bem pouco e fui saber por quê. Ela acordava muito cedo para organizar a casa e preparar o almoço. Eu, como pedagoga feminista, entendendo que é importante que ela tenha tempo para estudar e que uma mulher tem várias jornadas de trabalho, disse que todos os moradores da casa devem ser/estar envolvidos nos cuidados domésticos e sugeri que ela dividisse as tarefas domésticas com o marido e o filho de 8 anos, sendo que ela faria as refeições, o marido lavaria a louça e o filho tiraria a poeira. 

Gente, eu jamais imaginei que isso ali acima, faria tanta diferença na vida de alguém. Foi o que motivou ela a me dar as flores, mas mais do que isso, foi uma prova cabal de como as mulheres sofrem com a sobrecarga de trabalho e com as exigências que se mantém em um contexto de trabalho diferenciado. Eu recebi as flores, dizendo que não precisava, que era o meu trabalho.

No entanto, não aprendi sobre isso em meus estudos sobre Pedagogia ou na minha graduação em Pedagogia, um curso também feminino. Aprendi sobre as desigualdades de gênero com o feminismo e me apaixonando por ele, busquei fazer relações com a educação até chegar à Pedagogia Feminista, pela qual também me apaixonei, tamanha a proximidade com a Pedagogia Transformadora, de quem já era seguidora.

Fiquei muito feliz naquela noite, mas fiquei muito triste também, pensando que a situação daquela mulher-trabalhadora-mãe-estudante não é única e que o feminismo é extremamente necessário. Por fim, ela me disse que conversou com o marido e ele ficou de contribuir mais nas tarefas domésticas. E sorriu!  Sim, o feminismo possibilita finais felizes!


4 comentários:

  1. Paula querida temos tantas mulheres sofrendo com as demandas profissionais e os de dona de casa... poucos homens tem a sensibilidade e consciência de que precisa assumir a responsabilidade com a casa tb.
    Amei o texto!

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    1. Ananda, que lisonja você ter gostado, obrigada!
      Esse acúmulo de trabalho é quase invisível e vem sobrecarregando muito as mulheres. A partir do momento que a mulher trabalha fora de casa, a casa deveria deixar de ser uma tarefa exclusivamente sua, já que realmente sobrecarrega: trabalhos, estudos, filhos,...
      Precisamos trazer à tona o debate sobre a divisão do trabalho doméstico desde muito cedo, nas turmas de Educação Infantil, e educar uma nova geração que sofra menos e que compartilhe mais os espaços.
      Beijo vermelho :)

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  2. As mulheres fizeram conquistas profissionais importantes,mas acabou acumulando funções. ..os homens pouco se dispõe a dividir tarefas domésticas.

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